O Olhar de...
- Economista e política portuguesa (mais informações)
- Deputada ao Parlamento Europeu (desde Agosto de 2004), com assento nas Comissões de Assuntos Económicos e Monetários, Comissão dos Transportes e do Turismo
- Ministra do Planeamento do XIV Governo Constitucional (1999 a 2002) e Ministra do Ambiente do XIII Governo Constitucional (1995 a 1999).
- Professora Auxiliar da Faculdade de Economia da U.Porto (atividade suspensa).
- Antiga estudante da FEP, com Licenciatura em Economia (1977)
- Como é que teve origem e se desenvolveu a sua ligação à Universidade do Porto? Que principais momentos guarda da sua experiência enquanto estudante/ professora da U. Porto?
A Universidade do Porto e, em particular, a Faculdade de Economia são o meu referencial em termos de formação académica (aí completei cinco anos de licenciatura) e de exercício profissional (iniciado como monitora, ainda enquanto estudante, e posteriormente consolidado com o Mestrado e o Ph.D.).
No meu segundo ano de licenciatura aconteceu o 25 de Abril. Enquanto se ultimava o atual edifício na Asprela, abandonamos as instalações reduzidas da Faculdade de Economia (cinco salas no terceiro andar da atual Reitoria, aos Leões) e foi em salas emprestadas do Colégio João de Deus que discutimos o novo plano de curso. A instabilidade passou a dominar, desde as relações pessoais às teorias económicas – era verdadeiramente a Revolução! O que aprendemos nesses tempos, quer sobre a solidez dos conhecimentos que transmitíamos quer sobre o carácter dos seres humanos, foi único e valiosíssimo.
Ensinar é uma das coisas que mais gosto de fazer na vida, reconhecendo, no entanto, que a responsabilidade de formar os novos economistas é, por vezes, angustiante, sobretudo nos tempos que correm. Fomentar um pensamento simultaneamente informado e crítico nem sempre é fácil, mas deu-me particular prazer passar da área de conforto das matemáticas e da microeconomia - nas quais me iniciei como docente - para as áreas, nessa altura quase completamente virgens na academia portuguesa, da economia dos processos de integração europeia, antecipando a nossa adesão à então CEE, um tema especialmente sensível e actual no contexto mais amplo da economia internacional.
- Qual a importância da U. Porto no seu percurso profissional e que modo foi de encontro às suas expectativas?
As especificidades históricas do meu curso determinaram, em grande medida, a minha opção de não encarar a academia como um espaço isolado do mundo exterior. Ou seja: tentar intervir, calibrando o pensamento teórico pelo confronto com a realidade e, por outro lado, manter a capacidade de recuo, avaliação e crítica a que a academia obriga ao olhar, com algum distanciamento, a obra feita. Após vários anos de colaboração com a CCDR-N em temáticas de desenvolvimento regional, seis anos como ministra e vários anos como deputada nacional e europeia, sinto que essas experiências corresponderam a exercícios extremamente ricos e que acrescentam profundidade ao modo como se apresenta, avalia e ensina economia, reconhecendo todavia o excessivo preço a pagar por tal escolha em termos de carreira académica estrita.
- Como avalia o papel desempenhado pela Universidade, e particularmente pela Faculdade de Economia, no seio da comunidade (cidade, região, país)?
Na altura em que a Faculdade de Economia da Universidade do Porto foi criada, ela veio preencher uma séria lacuna em termos da requalificação do tecido empresarial tradicional do Norte na área da economia, à semelhança do que já existia em sectores de cariz tecnológico, em particular nas engenharias. O robustecimento desta semente inicial fez-se de forma gradual e com especial ênfase na componente aplicada e de gestão – a FEP, nascida em 1953, só em 1991 doutorou internamente um seu licenciado. Eu, como muitos da minha geração, saí para o exterior em busca dessa graduação mas, desde que surgi como a primeira mulher doutorada no Conselho Científico (que, em Economia, incluía Doutores “emprestados” de outras escolas e cabia à volta de uma mesa de reuniões) a evolução foi felizmente bastante rápida. Um tal crescimento comporta sempre riscos, mas a imagem de qualidade da FEP transformou-a num viveiro de quadros que, quer a nível empresarial quer institucional, ultrapassaram rapidamente o plano regional, preenchendo lugares da maior responsabilidade nacional e internacional.
- Que caminho deverá ser percorrido para afirmar cada vez mais a Universidade no contexto regional, nacional e internacional? Que Universidade gostaria que se celebrasse daqui a 100 anos?
É difícil antecipar tendências e definir estratégias num mundo em mudança célere, com cada dia mais parceiros e uma concorrência mais violenta e onde a economia, de forma mais evidente do que em qualquer outra época, parece condicionar a sociedade no seu conjunto e determinar as opções políticas. Neste quadro, gostava que a Universidade do Porto evoluísse por forma a manter o equilíbrio entre uma participação activa no contexto mundial e a salvaguarda da sua identidade própria. Ser “global” sem subserviência e “local” sem provincianismo, formando atores civicamente ativos, tecnicamente competentes e culturalmente robustos é o que desejo, sabendo como será difícil a concretização.
- Mensagem alusiva aos 100 anos da Universidade do Porto.
Para os jovens a quem a minha geração deixou, involuntariamente, um mundo muito mais complexo, instável e desafiante do que aquele em que nós vivemos, vão as minhas palavras de apreço e confiança. Atravessamos hoje uma fase particularmente angustiante mas sei que acreditam que outras, antes desta, foram vencidas por gerações menos preparadas e informadas do que a vossa. Se em cada crise há uma oportunidade, ninguém melhor do que vocês será capaz de a descobrir neste mundo que, de repente, se tornou imenso em riqueza e diversidade. Boa sorte para todos!
Foto: Paulo Cunha Martins
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